segunda-feira, 30 de julho de 2012

Ah! Ah! Eles erraram as bandeiras!


Estive lendo sobre as trapalhadas que aconteceram no início das Olimpíadas de Londres. Quero me ater a duas trapalhadas em específico:
1 – Em alguns panfletos de divulgação dos eventos, foi utilizada a expressão “unticket”.  “Ticket” é uma das palavras do inglês para “ingresso”. “Un” é um prefixo de negação. Porém, não existe a palavra “Unticket” no vocabulário inglês. Mesmo assim, isso não foi empecilho para que os organizadores utilizassem a expressão, tentando indicar que certos eventos eram fechados e, por isso, não teriam tickets à venda! O que os organizadores não contavam, entretanto, é que a população e os turistas entenderiam de modo errado a palavra que não existia: para os espectadores, “unticket” era alguma expressão de vanguarda, para indicar que o evento não precisava de ticket para entrar!
Sim, filas imensas de pessoas se formaram à porta de alguns estádios, para entrar nos eventos que “não precisavam de ticket”!
2 – Em alguns eventos, até o momento, bandeiras erradas foram relacionadas, para uso. Os países em certame simplesmente não receberam suas respectivas bandeiras!

Sim, eu sei. As Olimpíadas provavelmente são o evento mais difícil de organizar de todos. Embora o Superbowl seja o evento mais assistido do mundo, é apenas uma partida de futebol americano. São poucas horas de evento, com muito dinheiro envolvido. Dá para montar e desmontar um palco inteirinho para um mega-show, em 5 minutos, sem nenhum problema. A copa do mundo FIFA já toma semanas para o evento. Mas convenhamos: é só uma modalidade. Você efetua o planejamento para o primeiro jogo, e repete-o até a final.
Agora, as olimpíadas? São inúmeras modalidades. Dezenas (e até centenas!) de atletas para cada modalidade! Alimentação, estadia, transporte, medalhas, local de treino, local de competição, comunicação, armazéns para estoque dos materiais específicos para cada modalidade, juízes, médicos, apoio... Sem falar nos quesitos que eu me esqueci, aqui.

Complicado organizar isso tudo, não é?

Eu até compreendo que alguns detalhes mais específicos sejam confundidos. Como o caso da atleta de salto com vara brasileira em Pequim, que teve extraviada uma única vara (justo aquela que ela precisava), dentre mais de uma dezena de varas da competidora. Uma vara, de uma atleta, em um dia de competição, dentre várias varas de cada atleta? Compreensível que o auxiliar de estoque tenha se confundido.
Agora, esses dois erros que eu estou ressaltando não são específicos. Desculpem-me os condescendentes, mas saber a palavra correta para expressar seu pensamento e conhecer a bandeira dos países (pelo menos dos principais entre os mais de duzentos), são requisitos elementares para qualquer um.

Eu tracei um paralelo, aqui. No Brasil, por termos uma língua que não é referência no mundo, acabamos estudando outra língua em nossos colégios. Às vezes duas. Até três ou mais. Por não sermos um país referência no mundo, acabamos estudando outras culturas. Sim, eu tenho sérias dúvidas se os europeus ou norte-americanos debruçam-se sobre mapas da América do Sul, pelo menos para saber quais são nossas fronteiras, bandeiras e localização das principais cidades. Se eu falar “moicano” ou “apache”, você sabe que são índios norte-americanos. Agora, tenho dúvidas se os cidadãos-comuns sabem o que são “tupis” ou “guaranis”. Você deve saber a capital de pelo menos uns 50 países do mundo. Agora, sem pesquisar no Google. Se eu te pedir, sei que você consegue citar mais cinqüenta cidades importantes no mundo, que não são capitais, relacionando-as com seus países. Em contrapartida, europeus e norte-americanos talvez ainda imaginem que a capital do Brasil é Buenos Aires...

Tenho comigo que um dos motivos pelos quais somos um povo “de terceiro mundo” é justamente porque nos forçamos a estudar os outros povos. Eles próprios se dão tanta importância, que nós acabamos obrigados a estudar suas tradições, culturas e ideias, para podermos acompanhá-los.
Mas, em contrapartida, essa super auto-importância faz com que esses povos de “primeiro mundo” percam muito tempo se auto-estudando. Afinal de contas, eles são o centro do mundo, não é?
Fiquei imaginando, por um breve instante, que talvez o cidadão comum da periferia do mundo acabe tendo mais conhecimentos do que o cidadão comum destes países-referência. Claro: eles só têm que saber o que acontece com eles e o que acontece de principal mundo a fora. Diferentemente, nós precisamos saber o que acontece conosco, com os povos do primeiro mundo e, quando sobra tempo e espaço, os principais fatos do mundo.

Talvez seja exatamente essa a nossa desvantagem: ao ignorarem o terceiro mundo, norte-americanos e europeus ganham tempo para se especializarem em si próprios, em detrimento do conhecimento generalista que eles não possuem.
Por fim, é ironicamente divertido ver as manifestações de deboche para com os londrinos. Críticos exclamam: “Como os londrinos são burros! Erraram nas bandeiras!” Enquanto isso, a civilização londrina é muito mais educada, tolerante e eficiente do que a de qualquer crítico...





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