sábado, 12 de outubro de 2013

Top Gear 2, Potes de Plástico e a Minha Fúria

Meu pai afirma - com razão - que eu sou um cara furioso.

Eu assumo, eu confesso, eu assino, registro firma e pago o imposto: sou alguém furioso.

Cada segundo que eu leio a respeito do assunto, eu descubro mais e mais que eu tenho algum nível de autismo. Meio que de leve, intermitente.
Eu tenho uma inteligencia espacial excelente. Nunca treinei e, mesmo assim, sou um ótimo prestidigitador. Eu formo um mapa mental de toda a área à minha volta. Eu sei até aonde você consegue enxergar a partir do seu campo de visão. Eu sei como esconder e empalmar objetos, de modo que você não os veja.
Essa habilidade me faz ter a capacidade de visualizar à perfeição minha imaginação sobre o mundo real. Não é a toa que eu sempre fui tão bom em geometria. Não é a toa que eu sou um ótimo projetista arquitetônico. Não é a toa que LEGO sempre foi o meu brinquedo predileto.
A minha mente espacial sempre fez com que eu entendesse qualquer explicação com o mínimo de palavras, o mínimo de rabiscos e o mínimo de esquemas. A minha lógica aguçou-se. Não é a toa que, hoje, ganho a vida como desenvolvedor de software.
Aliás, sou particularmente bom em qualquer coisa que exija lógica. Como jogar vídeo-games, abstrair pensamentos, planejar e, é claro, escrever aqui, para vocês.

Eu citei os vídeo-games, porque muito do que eu executo na vida real veio do mundo virtual.

Talvez a maior influência virtual sobre minha vida seja o que eu chamo de "Projeto Motor de 80.000".

Se você foi criança, adolescente ou um adulto imaturo durante os anos noventa, você conhece o jogo "Top Gear 2", lançado para o Super Nintendo.

Nesse jogo, todos começávamos com um mesmo modelo de carro. E, desde o início do jogo, todos já podíamos ver os componentes do carro que poderíamos comprar, para melhorar nosso rendimento. O dinheiro era obtido de acordo com os resultados na pista.

Um dos componentes que tínhamos para comprar era o motor. Começávamos com um motor ruim. Depois, haviam outras três opções: Um motor fraquinho de 30.000 (três vitórias), um motor médio de 50.000 (cinco vitórias, né?) e o melhor motor, de 80.000 (oito vitórias, dãh!).

A ideia do jogo era evoluir os adversários de modo que você precisasse comprar todos os equipamentos que acompanhavam o motor fraquinho, primeiro. Depois, a dificuldade do jogo te obrigaria a comprar os equipamentos da linha do motor médio. E, por fim, você poderia adquirir os melhores equipamentos.

Mas para os jogadores realmente viciados em Top Gear 2, havia o desafio de tentar executar o "Projeto Motor de 80.000". A ideia era, basicamente, "pular" as etapas intermediárias e, assim, usar o carro básico do início do jogo até conseguir os 80.000 para comprar o melhor motor. Com os bônus das pistas, esse projeto poderia ser efetuado em seis ou sete corridas, caso todas fossem vencidas. Mas a chance de não conseguir os 80.000 e ter que se render ao motor de 50.000 ou - pior ainda - ao de 30.000 era muito grande. Ainda mais se você estivesse jogando com um amigo junto, no player dois.

Acontece que eu tinha o jogo e eu era muito bom nele. E, depois de algum tempo, eu só começava um novo jogo de Top Gear 2 se fosse para tentar as oito vitórias nas oito primeiras corridas e, assim, realizar o "Projeto Motor de 80.000". A repetição me levou à excelência. E a largar o jogo por achá-lo extremamente fácil.

Eu não notei, mas levei esse "Projeto Motor de 80.000" para a minha vida real, desde então. Aliás, só fui notar pouco tempo atrás.

Eu não consigo me contentar com o inferior ou com o intermediário. Preciso recitar um mantra de que "melhor começar de qualquer jeito e arrumar depois, do que não ter nada", para ser um bom profissional. Isso porque eu tento criar, seguir e executar o plano perfeito para tudo, sempre.

Nem penso no inferior, não aceito o intermediário. "Só o cume interessa", se você me permite a cacofonia.

Exemplo?

Eu sou um homem atípico. Eu não pego "qualquer uma". Para mim, ou é A MULHER QUE EU QUERO, ou não é NENHUMA. Sempre fui assim. Eu me valorizo mesmo e estou pouco me lixando para o que você acha.

Mais um exemplo?

Eu não trabalho aonde eu não gosto. E, se eu entro na empresa e descubro que "não é bem assim", eu logo luto para mudá-la para o ideal... ou saio.

Mais um:

Eu não tenho smartPhone. E não é por falta de dinheiro, não. É por não querer o simplório, o fraquinho, o intermediário ou o que está para ser tirado de linha pelo próximo que virá. Eu tenho PAVOR de pensar que vou gastar mais de dois mil reais em um celular que, daqui um mísero ano, já não será mais o melhor.
Porque os celulares com 3G eram os top. Menos de um ano depois, os 3G com tela HD eram os melhores. Menos de um ano depois, os 4G já estão aí no mercado. Para o ano que vem, estão prometendo celulares com telas flexíveis.
Imagine a mim com um celular de dois fucking mil reais nas mãos, sabendo que THIS SHIT não é mais o melhor aparelho do mercado!!!

E aonde entra a minha fúria nisso? Não, eu não fico furioso comigo mesmo. Eu consigo vencer estes demônios quando a briga é comigo mesmo. Tenho uma vida franciscana e só compro o que eu acho que será importantíssimo para mim e que vá ser uma excelente compra.

Faço minhas as brilhantes palavras de Trumam Capote:

"É horrível na vida da gente ficar sem alguma coisa que nós queremos; mas caramba, o que me enfurece é não poder dar a alguém alguma coisa que a gente queria que ele tivesse."
Truman Capote - Histórias Maravilhosas

Pelos idos da minha adolescência eu briguei certa vez com a minha avó. Para mim, foi uma briga feia. Ela deve ter esquecido, já.
O supermercado "entregou o rancho" lá em casa. E, no meio das compras, estavam vários potes de plástico que minha avó havia comprado.

Os potes de plásticos de casa estavam velhos e precisavam ser substituídos.
Só que...
Os potes serviam, principalmente, para colocarmos restos de comida que nunca eram consumidos, de um dia para o outro.
Na minha cabeça, minha avó comprava o motor de 30.000 todo mês. Era dinheiro mal gasto, repetidamente!

Tentei alertar a ela que, se mudássemos alguns hábitos, poderíamos economizar MUITO dinheiro. Como todos os dias sobrava comida no almoço e ninguém a consumia posteriormente, sugeri que ela passasse a fazer menos comida. De quebra, não precisaria mais comprar potes de plástico. Pronto, estava utilizando toda a minha lógica para poupar pelo menos uns 100 reais, todo mês!

Ela não me deu ouvidos. Fez pouco caso e eu fiquei IRADO. FURIOSO. Como meu pai sempre observou muito bem. Eu sou alguém furioso porque eu não consigo mostrar para os outros que as minhas certezas melhoram - efetivamente - a vida de todas elas.

Mas isso tudo não é o pior. Porque hoje, adulto, eu consigo provar por A + B que o meu método funciona. Na minha casa, cozinho o necessário para a refeição, NUNCA compro uma fruta a mais do que eu sei que vou consumir e só tenho um único pote de plástico, que serve para fazer gelatina.

Escrevi este texto inteiro poque, na última semana, escutei uma coisa de uma pessoa, que ultrapassa um pouco mais a linha do "Projeto Motor de 80.000". E, obviamente, me deixou um pouco mais furioso.

Basicamente, uma pessoa notou que eu estava certo quando falava que temos fases na vida. Falou que notou que eu estava certo. E falou que notou que eu sempre fiz o melhor para ela.

Mas, mesmo SABENDO que eu sou uma pessoa do bem, alguém instruído, avisado, observador, compreensivo e prestativo... Essa pessoa prefere virar as costas para mim e para minha capacidade de adiantar a vida dela. Essa pessoa fala - com todas as palavras - que prefere se submeter aos erros da sua fase na vida, do que pegar na minha mão, deixar que eu a proteja e, assim, ganhar alguns anos ali na frente.

É alguém que está vivendo a antítese do "Projeto Motor de 80.000".

Alguém que eu achava extremamente inteligente. Mas que, hoje, me enfurece com a insistência no processo ilógico, insensato... INSANO!

Todos temos nossas fases na vida e é importante passarmos por elas. Os nossos erros ajudam a moldar nossa personalidade, evoluem nosso pensamento e nos tornam pessoas melhores.
Mas...
Há os que não conseguem aprender nem quando eles próprios erram.
Há os que aprendem com o próprio erro.
Há os sortudos que não erram.
E existem as pessoas INTELIGENTES, que observam a HISTÓRIA para APRENDEREM COM OS ERROS DOS OUTROS.

Porque, amigo, só adolescentes dão valor aos próprios erros, antes que estes aconteçam. E adolescentes burros, ainda por cima. Passa um tempo na sua vida, e tudo o que você mais quer é que sempre exista alguém para lhe avisar de cada pedra no caminho. Que te ajude a criar planos o mais executáveis o possível.

Por tudo isso eu fico furioso. É horrível ser uma ferramenta social sem uso.

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